quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Dona Irene

"Qualé Dadinho, o que tu tá fazendo na minha boca?"

A Irene foi taxativa: "tu não fica aqui um mês". Essa foram as palavras que ouvi após meu primeiro dia de cozinha no Chez. Ela viu de cara que a faxina não era meu forte e talvez por isso disse essas palavras nada convidativas para um aspirante a cozinheiro. Não me abalei e tampouco fiquei com raiva. Meu sentimento foi de indiferença, pois sabia que até chegar onde eu queria, iria encontrar várias pessoas como ela na minha trajetória.

A Irena, como o chef a chamava, era uma excelente funcionária e boa cozinheira. Cuidava da praça dos grelhados e de todas as carnes, pescados e frutos do mar do restaurante. Sua frase clássica era a seguinte: "se eu fosse tu...", e começava a dizer o que ela queria que você fizesse. Ela me ensinou a desossar perdiz, rechear e costurar. Uma verdadeira tarefa de gincana, que requer boa técnica e excelente motricidade fina. No mais, vi que o serviço dela de mis en place não era tão difícil assim. Na hora do vamos ver, aí sim, ela era eficiente.

Não tenho preconceito contra pessoas mais velhas na cozinha, mas sei que o serviço é pesado. Chega uma hora que o corpo não aguenta. E foi o que aconteceu com a dona Irene. Teve um problema de coluna e ficou quase um ano encostada.

Buenas, quando ela voltou eu estava no fogão, por merecimento e também pelo meu empenho em conquistar essa vaga. A cena parecia aquela fátidica do filme Cidade de Deus aonde Dadinho vira Zé Pequeno: "quem foi que disse que a boca é tua?". Ela achava que retornaria pro seu lugar, mão isso não aconteceu.

E a Irena foi pra praça das saladas.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Mestres - 2º Capítulo

Monsieur Remondeau

Tive três mestres num lugar só. Foi no Chez Philippe. O Chez ganhava todo ano o prêmio de melhor restaurante e chef, a equipe era a elite da cozinha de Porto Alegre. O que vou falar do Philippe? O currículo e história dele, todo mundo já sabe. O que a maioria das pessoas não sabem é que ele entende mais do que qualquer um sobre patisserie. Que o chef é uma das pessoas mais bem humoradas que já vi, sempre de alto astral, a não ser quando volta algum prato pedindo "pra passar" um pouco mais o filé... Tornou seu pupilo, Guilherme "Chinês" Aguiar , em seu subchef após anos de aprendizagem e trabalho árduo. Também formou outro aprendiz em chef patissier, o Marlos "Mala" Hossein.

O Chinês, a estagiária Bruna e eu

Foi com esses três caras que aprendi o que é ser profissional e todos foram meus mestres. Aprendi que os cascas grossas na cozinha são os cozinheiros do fogão, e para chegar lá leva um bom tempo. Segui todos os degraus passando pela patisserie, garde manger e finalmente o fogão. O China e o Marlos me mostraram como é trabalhar rápido e com destreza praticamente sem errar. E o mais importante, como produzir diversas receitas ao mesmo tempo.

O Philippe me ensinou muito sobre tudo, tinha paciência com minhas perguntas e sempre me ajudava quando o cardápio mudava. Foi lá que soube que para ser cozinheiro, tinha que ter boa memória. Quando chegava o maitre Valdir Devitt ou o garçom Don Peres, a gente já sabia que tinha memorizar os pratos, os pontos das carnes e o número da mesa que o chef marchava.

"Atenção cozinha, marcha!", e começava o espetáculo.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Papo de Viagem

Convite para conhecer a África do Sul

A fotógrafa e jornalista Cris Berger está com um projeto bem legal. Explico. Verdadeira globetotter que é, já coleciona carimbos no passaporte de diversos lugares do mundo. Em parceria com a Casa Mundi, o Papo de Viagem com Cris Berger é um evento cultural e mostrará o olhar da Cris por alguns lugares aonde ela passou. Além das imagens outros aspectos culturais como a gastronomia, música e vinhos serão celebrados no encontro.

Fui convidado pra criar os acepipes e a Flavinha Mello pra fazer a trilha sonora. Os vinhos serão elegidos pela Vinhos do Mundo, que colocará para degustação vinhos da vinícola Avondale. O tema não foi nada fácil: África do Sul. Não sei nada da SA, mas não me intimidei. Afinal, a internet é uma excelente ferramenta de pesquisa. O resto é talento do chef, que tem que interpretar a cozinha local e tirar referências para criação.

Buenas, através de um site oficial, descobri que a culinária Cape Malay está enraizada no país que será sede da Copa do Mundo em 2010. Os malaios aportaram em solo sul africano há séculos atrás e trouxeram junto seus hábitos e cultura.

Peguei dois pratos tradicionais e fiz uma releitura para colocá-los na forma de canapés. O tomato bredie é um cozido de carneiro com tomates e o curried fish, um peixe com carril.

Quer saber um pouco mais deste país fascinante, que tem uma gastronomia rica e vinhos extraordinários, então não perca essa oportunidade única.

Serviço
Papo de Viagem com Cris Berger
Data: 15/09/09
Local: Moliterno Livraria e Cafeteria, rua Tobias da Silva, 22.
Horário: 19:40 às 21:00 hs
Ingresso limitados: R$25,00
Reservas: 3024-4284

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Choripan

Amor a primeira mordida

Cheguei em casa do trabalho com muita fome. Geralmente como algo leve pra poder dormir tranquilo. Hoje quebrei essa regra, e com muita classe. Queria algo que trouxesse conforto. Abri a geladeira e lá estava um pedaço de linguiça Borússia, feita na Serra Gaúcha.

Pensei: "o que vou fazer com essa linguiça?". Achei dois pãezinhos do súper semi-duro. Humm... comecei a ligar os pontos. Se colocasse esses pães no forno, com azeite de oliva e queijo, eles voltarão a viver. Cheguei na equação perfeita: pão + linguiça= choripan!

Fatiei a linguiça e grelhei na frigideira. Quando estava quase pronto me deu outro estalo. Vou fazer um molho com a crosta que ficou no fundo da frigi. Adicionei mais um pouco de oliva e refoguei umas duas colheres de sopa de cebola. Quando estavam quase douradas, acrescentei duas colheres de chá de açúcar. E para finalizar, fiz a deglaçagem com vinagre.

O pão com o queijo derretido estava quentinho e crocante. Foi só colocar as linguiças e o molho e partir para o abraço. Estava pronto o melhor choripan da minha vida.

Sem comentários. Acabei de comer e tive que escrever esse post.

P.S. Choripan é como nosso hermanos chamam o pão com linguiça.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Jamba Juice

The real smoothie

Fui apresentado ao suco smoothie na California pelo meu grande amigo Jeff. O Jeff sabia que eu gostava de comer bem e me apresentou todos seus lugares favoritos no Sul da California. Claro, todos perto de picos de surf, pois era o que a gente mais fazia por lá.

Logo após uma sessão de 3 horas de altas ondas no Pier de Huntington Beach o Jeff falou: "Hey Juiceman, let's have a juice?" Ele me chamava de Juiceman, pois nos conhecemos na praia da Guarda do Embaú e eu fazia sucos diferentes, os quais o Jeff provou e aprovou.

"Sure dude", foi o que respondi, mas estava com muita fome e achei que apenas um suquinho não ia segurar a fome de leão pós surf. Me enganei. Quando entramos no Jamba Juice ele foi categórico: "Order a smoothie bro". Não perguntei o que era, apenas assenti com a cabeça e pedi o meu, o qual não me recordo o sabor, mas tinha blueberry.

Bah... que descoberta! A textura não era de suco "convencional", era cremoso e tinha um mix de frutas naturais, com banana e um frozen yougurt non fat. Com 500ml pra varar, tive que fazer um certo esforço. E para a minha felicidade, além de ser delicioso e saudável, o smoothie equivalia a uma refeição, com toda certeza. Fiquei fã do Jamba, de carteirinha.

Quando vi que aqui em Porto Alegre começaram a vender smoothie, fui verificar se era parecido com o do Jamba. Para minha decepção era nada igual, nem em textura quanto sabor.

Até hoje sou orfão dessa maravilha chamada smoothie...

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Sarapatel

Que saudades do sarapatel...

Alguém aí já ouviu falar de sarapatel? Esse prato fez parte da minha infância e é daquela categoria: "por favor, não me conte do que é feito". Minha infância foi na Bahia, e lá o sarapatel é como se fosse um carreteiro, todo mundo gosta.

O visual não é dos mais atraentes, parece uma carne moída de diversas tonalidades. Na verdade a "carne moída" são as tripas do porco. Fiz uma pesquisa e descobri que o sarapatel tem origem portuguesa, mas ganhou fama mesmo na boa terra.

Depois que voltei a morar em Porto Alegre fui visitar meus amigos em Salvador na mais quente estação do ano. O calor é escaldante, e ao despertar o sol da matina queima como o do tarde. Meu camarada de longa data, o Leo, tem uma casa na paradisíaca praia de Guarajuba, em frente ao mar. Lugar ideal pra curtir o dia do meu aniversário. Acontece que a tia Sônia, mãe de Nardo, como ela o chama, faz um sarapatel daqueles, e me presenteou com essa iguaria.

Ser lembrado pelos amigos e passar o dia do seu aníver num lugar onde a pressa não existe, o mar é logo ali, e a rede fica te encarando, é como essas propagandas de um cartão de crédito: "não tem preço!"

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Churros

Churros chic da Xooro em LA

Não me recordo quando e onde foi a primeira vez que comi churros. Provavelmente foi numa praça ou parque, como de costume. Aquele tubo recheado com doce de leite envolto em uma crosta de açúcar e canela me deixou curioso por um bom tempo.

Como se faz? Por que é tão bom?

Dúvidas. Durante muito tempo as pessoas escondiam suas receitas. "Esse segredo eu não revelo", já ouvi muito esse papinho em restaurante. Não passam de medrosos. Sempre revelei minhas receitas sem medo de ser copiado. Afinal, a técnica, a sensibilidade na hora de preparar uma receita vem de cada um. Garanto que muitos de vocês que fazem alguma receita do blog, devem fazer do seu jeito, ou dar seu toque pessoal, mudando algum ingrediente ou adicionando outros.

Mas voltemos aos churros. Quando fui chef do Constantino Café tive a missão de fazer a massa do churros. Matei a curiosidade de infância. Poucos ingredientes, porém de uma complexidade imensa. Acertar o ponto certo da massa é muito difícil, ainda mais num ambiente aonde a temperatura e umidade do ar não são controlados.

Venci a batalha com méritos, pois era disparado a sobremesa mais pedida da casa. O churros ficou "padrão", como falamos na cozinha. Bem sequinho, frito na temperatura correta e com uma novidade na época (2005) : dip de nutella, além do tradicional doce de leite.

Outro dia parei no Le Bistrot e conversando com a querida Kaeterly Becker fiquei sabendo das novidades. Ela me disse que a cozinha dos dois restaurantes (Le Bistrot e Constantino) estão mais saudáveis do que nunca e as fritadeiras tinham sido abolidas das cozinhas.

"Menos a pequenina, que usamos pra fazer os churros, pois os clientes amam essa sobremesa", confessou a Kaeterly.

Quem diria que o doce do parque invadiria a zona nobre da cidade tornando-se glaumuroso com uma nova roupagem?

Essa receita é da famosa padaria Barcelona, de São Paulo.

Churros da Barcelona

Ingredientes - Quantidades
farinha de trigo - 1 kg
margarina - 200 g
açúcar - 100 g
sal - 10 g
água - 1 litro

Preparação:

- Leve ao fogo a margarina, o açúcar, a água e o sal.
-Quando estiver fervendo e tudo diluído acrescente a farinha de trigo, mexendo sempre com uma espátula para não empelotar.
-Assim que começar a desgrudar do fundo da panela, coloque em cima da mesa, espere esfriar um pouco, dê uma sovada e leve para o aparelho de fazer churros.
-Frite em óleo quente a 180º e seque em papel absorvente.
-Faça uma mistura de açúcar cristal com canela e passe por cima dos churros.
-Recheie com doce de leite, nutella ou invente o seu!